Introdução
O direito previdenciário passou por inúmeras mudanças nos últimos anos. Pode-se dizer que uma das grandes mudanças, foi implantada com a lei n. 13.135, de 17 de junho de 2015, que estabeleceu requisitos na concessão de pensão por morte, bem como o tempo de duração para o dependente cônjuge ou companheiro.
Passou-se a exigir o mínimo de 18 (dezoito) contribuições mensais, bem como que o casamento ou a união estável tivessem sido iniciados em mais de 2 (dois) anos, antes do óbito do segurado, salvo contrário, a pensão por morte seria fixada em apenas quatro meses de benefício.
Estabeleceu-se também, transcorridos os períodos acima descritos, o tempo de duração do benefício, escalonando conforme a idade do cônjuge ou companheiro sobrevivente, partindo-se de 3 (três) anos de duração para o cônjuge ou companheiro com menos de 21 (vinte e um) anos de idade, até vinte anos de benefício para o cônjuge ou companheiro que possuísse entre 41 (quarenta e um) a 43 (quarenta e três) anos de idade.
O que era a regra, passou a ser exceção, sendo concedida a pensão por morte em caráter vitalício apenas ao cônjuge ou companheiro, cuja data do óbito do instituidor do benefício já tivesse completado 44 (quarenta e quatro) anos de idade.
No mesmo ano foi promulgada a lei n. 13.183, de 4 de novembro de 2015, que possuiu como principal mudança a possibilidade de não incidência do fator previdenciário nas concessões de aposentadoria.
Tal regra possibilitou aos segurados a concessão da aposentadoria, independente de idade mínima e sem a aplicação do fator previdenciário, nos casos em que houverem preenchidos o mínimo de 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem.
A referida norma ainda encontra-se em vigência, sendo que a cada ano que passa, a pontuação exigida sobe um ponto; hoje, no ano de 2020, a exigência é de 87 pontos para mulher e de 97 pontos para homem para que, ao final, a exigência seja 100 (cem) pontos para a mulher e 105 (cento e cinco) pontos para o homem, sendo que para a soma dos pontos, conta-se tanto os anos de idade do segurado, como os anos de efetiva contribuição para a previdência.
Anteriormente, no final de 2016, o governo do então presidente da República Michel Temer enviou uma proposta de reforma da previdência ao Congresso Nacional, sendo protocolada como a PEC 287/2016. Em fevereiro de 2018, o governo anunciou oficialmente a suspensão da tramitação da proposta e Emenda Constitucional, tendo em vista a má repercussão que a proposta gerou no mundo político e para a sociedade em geral.
Contudo, em 20 de fevereiro de 2019, o atual presidente da República, Jair Bolsonaro entregou ao Congresso a proposta de reforma elaborada pela equipe do Ministério da Economia, chefiada por Paulo Guedes, protocolada na Câmara dos Deputados como a PEC 6/2019.
A PEC 6/2019 foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania da Câmara (CCJ), em abril do mesmo ano, na Comissão Especial, sendo aprovada pelo plenário da Câmara em primeiro turno no mês de julho, e em segundo turno em agosto de 2019.
Por sua vez, no Senado Federal, a Reforma da Previdência foi definitivamente aprovada em 23 de outubro de 2019, ocorrendo a promulgação do texto como Emenda Constitucional pelos presidentes das duas casas do Congresso Nacional, em 12 de novembro de 2019, sendo recepcionada como a Emenda Constitucional 103.
Ocorre que após a Reforma da Previdência, muitos operadores do direito passaram a enxergar no direito previdenciário um ramo promissor.
Da inaplicabilidade do divisor mínimo – possibilidade de descarte das contribuições previdenciárias
Para alguns operadores do direito, a Reforma da Previdência trouxe apenas prejuízos aos segurados, porém, será demonstrado que além de prejuízos aos segurados e aos novos filiados da Previdência Social, a EC 103/2019 estabeleceu novas regras e possibilidades de cálculo; com isso, passou-se a possibilitar que a regra nova garanta a possibilidade de uma renda mensal inicial mais vantajosa ao segurado.
Sob o ponto de vista jurídico, uma das melhores mudanças que ocorreram com a Reforma da Previdência consiste na inaplicabilidade do divisor mínimo, ou seja, conforme a Emenda Constitucional 103/2019, será utilizada a média aritmética simples dos salários de contribuições, correspondentes a 100% (cem por cento) de todo período contributivo, desde a competência julho de 1994, e não mais o divisor mínimo que foi criado com a lei n. 9.876, de 26 de novembro de 1999.
Para fins de compreensão, o divisor mínimo é a média aritmética simples dos maiores salários de contribuição, correspondentes a, no mínimo, 80% de todo o período contributivo decorrido desde a competência de julho de 1994, para aqueles segurados que se fi liaram a Previdência Social até o dia anterior à data de publicação da lei n. 9.876, de 26 de novembro de 1999.
Antes da Reforma da Previdência, se o segurado, filiado à Previdência até 25 de novembro de 1999 não possuísse 60% (sessenta por cento) de contribuições, entre julho de 1994 até a data do requerimento do benefício previdenciário, o salário seria calculado pela soma de todos os salários de contribuição do período, nesse caso, sem a aplicação da regra dos 80% (oitenta por cento), maiores salários de contribuição, aplicando-se, então, o divisor mínimo (60% do período decorrido).
Ou seja, se o segurado possuísse poucas contribuições depois de julho de 1994, o salário de benefício poderia ser fixado bem abaixo do esperado, prejudicando substancialmente a renda mensal do segurado.
Contudo, a Reforma da Previdência afastou a necessidade de aplicação do divisor mínimo, possibilitando ainda, que o segurado solicite o descarte das menores contribuições, sem que o tempo descartado o prejudique na concessão do benefício. Tal previsão vem expressa no §6° do art. 26 da EC 103/2019.
Antes da Reforma, era utilizado para o cálculo do benefício previdenciário todos os salários de contribuição a partir de julho de 1994, contudo, com a aplicação do art. 26 da EC n. 103/2019, se o segurado possuir apenas uma contribuição a partir de 1994, desde que mantido o tempo mínimo de contribuição exigida, o benefício será concedido.
Ou seja, se as contribuições previdenciárias após julho de 1994 não contribuírem para a majoração do cálculo, pode-se requerer o descarte, sem que ocorra o indeferimento do benefício.
Deve-se atentar ao fato, que essa regra é aplicada a aposentadoria por idade, em que o segurado tiver a idade mínima exigida (65 anos para homens e 62 anos para a mulheres, observadas as regras de transição), bem como o tempo mínimo (15 anos para os filiados na Previdência até o dia anterior à data de vigência da EC 103/2019).
Outra observação a ser feita pelo advogado na análise do melhor benefício para o seu cliente, é que, após a Reforma da Previdência, as concessões de aposentadoria terão como cálculo 60% (sessenta por cento) quando atingir o tempo mínimo, acrescido de 2% (dois por cento) a cada ano em que o segurado tiver completado a mais de tempo de contribuição.
Portanto, se for solicitado o descarte de contribuições com fundamento no art. 26, §6º da EC n. 10 ¨3/2019, as contribuições descartadas não poderão ser incluídas no coeficiente utilizado no cálculo.
Após a reforma da previdência uma única contribuição a partir de julho de 1994 pode garantir a concessão da aposentadoria…
Contudo, mesmo utilizando o coeficiente mínimo de 60% (sessenta por cento), a renda mensal da aposentadoria pode ser fixada bem acima do valor, que seria fixado se fossem utilizadas todas as contribuições e com o coeficiente de 100% (cem por cento), por se tratar de média.
Diante desses impactos, é certo que a advocacia previdenciária ganha ainda mais importância e visibilidade, sendo que além da figura social e de extrema importância entre o cidadão e os requerimentos junto à Previdência Social, mostrando ser uma área promissora do direito para aqueles que possuem domínio da legislação previdenciária brasileira.
Considerações finais
É certo que o direito previdenciário passou por grandes mudanças nos últimos tempos, caracterizando a necessidade de atualização constante pelo profissional do direito.
O presente artigo buscou demonstrar que há meios benéficos de aplicação das regras contidas na Reforma da Previdência; para tanto, o profissional precisa ter conhecimento tanto da legislação, quanto das formas de cálculo.
Aliás, é no advogado que o cliente confia o bem mais precioso, qual seja, sua própria subsistência contida na garantia da remuneração justa e adequada após a inatividade.
Pode-se concluir que a área de atuação previdenciária é, sim, uma das áreas do futuro da advocacia, pois todo cidadão acabará necessitando de um advogado para auxiliá-lo na busca do seu direito, seja na concessão ou na manutenção do seu benefício assistencial ou previdenciário.
Referências
AMADO, Frederico. Curso de Direito Previdenciário. 12. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Juspodivm, 2020.
JAGUARIBE, Helio. Brasil: reforma ou caos. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
BRASIL. Decreto-Lei n. 3.048, de 6 de maio de 1999. [Regulamento da Previdência Social]. Diário Oficial da União, Brasília, 6 de maio de 1999. Disponível em: < www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm>. Acesso em: 30 nov. 2020.
BRASIL. Decreto n. 10.410, de 30 de junho de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, 1º de agosto de 2020. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/D10410.htm>. Acesso em: 30 nov. 2020.
BRASIL. Emenda Constitucional n. 103/19, de 12 de novembro de 2019. Diário Oficial da União, Brasília, 13 de novembro de 1999. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc103.htm>. Acesso em: 30 nov. 2020.
BRASIL. Lei n. 8.213/91, de 24 de julho de 1991. Diário Oficial da União, Brasília, 25 de julho de 1991. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm>. Acesso em: 30 nov. 2020.
BRASIL. Lei n. 9.876/1999, de 26 de novembro de 1999. Diário Oficial da União, Brasília, 29 de novembro de 1999. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9876.htm>Acesso em: 30 nov. 2020.
Mônica Jappe Göller Kuhn
Advogada. Sócia-fundadora do escritório Fontenelle & Göller Advogados Associados. Formada em Direito pela Universidade do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – (Unijuí). Especialista em Direito Previdenciário pela Faculdade Verbo Educacional, de Porto Alegre. Especialista em Gestão Ambiental pelo Instituto Federal de Rondônia (IFRO). Associada do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP). Membro das Comissões de Direito Previdenciário e Direito das Prerrogativas da OAB Seccional Rondônia. Palestrante.