Introdução
A Lei n. 11.419/06 foi promulgada para regulamentar o uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, alterando vários artigos Código de Processo Civil de 1973. Sendo que o parágrafo único do art. 154 do Código de Processo Civil, foi incluído pela Lei n. 11.280/2006, para que os tribunais, no âmbito da respectiva jurisdição, pudessem disciplinar a prática e a comunicação oficial dos atos processuais por meios eletrônicos, atendidos os requisitos de autenticidade, integridade, validade jurídica e a operabilidade da ICP-Brasil. Já em 2015, o Código de Processo Civil trouxe vários artigos tratando do processo eletrônico, mas ainda de maneira tímida.
Desde então, o Poder Judiciário passou a realizar vários estudos quanto a realização de audiências por videoconferência, como o realizado pelo TRT da 2ª Região, através da Portaria GP/CR 21/2015, que instituiu à época um grupo de estudos para analisar a viabilidade de audiências virtuais, tendo por base a Resolução 105 do CNJ, e também a Lei n. 11.900/2009, que previam a possibilidade de inquirição de testemunha por videoconferência.
Contudo, em virtude do surgimento do novo coronavírus, em dezembro de 2019, com a decretação de pandemia, a sociedade se viu obrigada a utilizar as plataformas digitais como nunca tinha usado e não foi diferente com o Poder Judiciário, trazendo a discussão, a prática de atos processuais que até então eram comuns de forma presencial para totalmente virtual.
Assim, o presente artigo traz à baila o debate acerca da Justiça do Trabalho, bem como, escritórios de advocacia, visando as medidas de segurança no combate à Covid-19, que as audiências de instrução por meio de videoconferência, observem o princípio da incomunicabilidade das testemunhas.
1 Surgimento da Covid-19 e seus impactos no poder judiciário
O mundo ouviu pela primeira vez sobre coronavírus, em dezembro de 2019, onde de destacou a cidade de Wuhan, situada na China. Desde então, esta doença cresceu de forma exponencial em todos os continentes. Em fevereiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde passou a nomear tal doença como Covid-19 e em março de 2020 decretou-se a pandemia. Em meados de janeiro a imprensa começou a reportar casos sobre um “misterioso vírus que causava problemas respiratórios”, tendo este vírus depois sido classificado como um coronavírus e chamado numa primeira fase de 2019-nCoV. Inicialmente, 800 pessoas foram infectadas e houve 259 mortes na China, mas houve casos também no Japão, Tailândia, Coreia do Sul, França e Estados Unidos, todos associados a pessoas que haviam viajado para a China recentemente. Em 20 de janeiro a OMS estimava que o número de casos poderia estar próximo de dois mil.
A 11 de março de 2020, o surto foi declarado uma pandemia, sendo que o numero de casos confirmados a nível mundial atingiu mais de 121000, sendo em 120 diferentes territórios, dos quais mais de 80.000 na China. O número de mortes ascende a 4 300, havendo mais de 1.200 mortes fora da China1.
Com o reconhecimento de pandemia pela OMS, inúmeros países passaram a implementar o isolamento social em seus territórios, visando não apenas reduzir a circulação de pessoas, mas também paralisando diversos seguimentos da sociedade, comércio, educação, lazer, entes público, como poder judiciário. Diante de tal cenário, em março deste ano, o Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo n. 06/2020, decretou o estado de calamidade pública estabelecendo medidas de isolamento social objetivando evitar a propagação da Covid-19.
O Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região, desde o início do mês de março, passou a publicar vários Atos: Ato n. 1/2020 – Presidência – 13 de março de 2020 (revogado); Ato n. 2/2020 – Presidência – 17 de março de 2020 (revogado); Ato n. 3/2020 – Presidência – 18 de março de 2020 (revogado); Ato n. 4/2020 – Presidência – 23 de março de 2020 (revogado); Ato n. 5/2020 – Presidência – 27 de abril de 2020 (VIGENTE).
Dia 19 de março de 2020, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n. 313/2020, estabelecendo no âmbito do Poder Judiciário, regime de Plantão Extraordinário, para uniformizar o funcionamento dos serviços judiciários, com o objetivo de prevenir o contágio pelo novo coronavírus – Covid-19, e garantir o acesso à justiça neste período emergencial. Também, no mesmo dia 19 de março de 2020, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, através do Ato Conjunto CSJT.GP. VP e CGJT. n. 1, suspendeu a prestação presencial de serviços no âmbito da Justiça do Trabalho de 1º e 2º graus e estabeleceu protocolo para a prestação presencial mínima e restrita aos serviços essenciais ao cumprimento das atribuições finalísticas da Justiça do Trabalho de 1º e 2º graus como medida de emergência para prevenção da disseminação do novo coronavírus (Covid-19).
O Conselho Nacional de Justiça, através da Portaria n. 61, de 31 de março de 2020, instituiu a plataforma emergencial de videoconferência para realização de audiências e sessões de julgamento nos órgãos do Poder Judiciário, no período de isolamento social, decorrente da pandemia Covid-19.
No dia 17 de abril de 2020, a Justiça do Trabalho, por meio do Ato Conjunto CSJT. GP.GVP.CGJT n. 5, estabeleceu que os prazos processuais suspensos, voltariam a fluir normalmente a partir de 4 de maio de 2020, com a realização de audiências iniciais a partir de 18 de maio de 2020; e audiências unas e de instrução, a partir de 25 de maio de 2020.
2 Da audiência virtual
A história tem mostrado que toda novidade, sempre é vista com muito receio. Assim, aconteceu com a máquina de datilografar, computador, impressora (matricial, tinta, laser) quando passaram a ser usadas desde o século passado até os dias de hoje. Quando a tecnologia passou a efetivamente fazer parte do cotidiano da sociedade na década de 90, percebeu- se a contribuição enorme que tudo isso poderia trazer para o judiciário.
Evolução jurídica
A Lei n. 11.419, de 19 de dezembro de 2006, foi promulgada para regulamentar o uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais nas esferas cível, penal e trabalhista, tanto na comunicação de atos, como na transmissão de peças processuais, alterando a Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil.
No âmbito da Justiça do Trabalho foi aprovada a Instrução Normativa 30, de 13 de setembro de 2007, do Tribunal Superior do Trabalho, regulamentando a Lei n. 11.419/06.
Em 2009, com a promulgação da Lei n. 11.900, de 8 de janeiro de 2009, introduziu-se no sistema processual penal brasileiro a possibilidade de realização de interrogatório por videoconferência, alterando o art. 185 do CPP, visando solucionar questões ligadas a oitiva de testemunhas e de vítimas. E, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabeleceu as regras quanto a sua aplicação através da Resolução n. 105/2010.
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região editou o Ato GP n. 19/2015, instituindo já na época, o sistema de audiências por videoconferência no âmbito do Tribunal e estabelecendo as varas piloto na fase inicial de implantação.
O Código de Processo Civil de 2015 estabeleceu as audiências de conciliação virtuais no âmbito cível através do art. 334 § 7º do CPC2.
A Lei n. 13.105/15, CPC 2015, quando promulgada, trouxe poucas inovações acerca do processo eletrônico, destacando-se, art. 198 e parágrafo único (admissão do peticionamento em papel caso o Judiciário não disponibilize equipamentos à prática de atos processuais); art. 199 (unidades do Poder Judiciário assegurar às pessoas com deficiência acessibilidade aos sítios na rede mundial de computadores); art. 194 (acessibilidade e interoperabilidade dos sistemas); art. 195, (necessidade de cumprimento de requisitos previstos no Marco Civil da Internet no que se refere à adoção de padrões abertos; art. 334, § 7º (realização de audiência de conciliação ou de mediação por meio eletrônico); art. 367, § 6º (gravação da audiência de instrução e julgamento por qualquer das partes, independente de autorização judicial); art. 236, § 6º, art. 453, § 1º e art. 461, § 2º (admissão da prática de atos processuais por videoconferência, ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, no depoimento pessoal da parte, na oitiva de testemunhas e na acareação, nos casos em que esses residam em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo; art. 937, § 4º (permissãodo advogado, realizar sustentação oral por meio de videoconferência); art. 945, § 3º (desnecessidade de motivação quanto à discordância quanto ao julgamento por meio eletrônico
dos recursos).
No dia 27 de abril de 2020 foi publicada a Lei n. 13.994/20, estabelecendo audiências de conciliação por meio virtual nos juizados especiais cíveis.
3 Audiência de instrução trabalhista por videoconferência
Com o atual cenário de pandemia, medidas de isolamento social foram tomadas para evitar a propagação da Covid-19, como setores da saúde de estados e municípios alcançarem uma melhora em termos
de infraestrutura e contratação de profissionais.
O Conselho Nacional de Justiça, por meio da Portaria n. 61 de 31/3/2020, conferiu aos tribunais, de forma opcional, a utilização da ferramenta Webex, disponibilizada pela empresa Cisco Brasil. Há
tribunais utilizando WhatsApp ou a ferramenta Google Meet para a realização de audiências e deixou para os tribunais regulamentarem os procedimentos quanto a realização de audiências por
videoconferência. O CNJ também disponibiliza em seu site, orientações a serem observadas quando da participação nessas audiências virtuais3. O Poder Judiciário, visando manter a prestação
jurisdicional, adotou inúmeros atos, como o Ato Conjunto CSJT.GP.GVP.CGJT n. 5, de 17 de abril de 2020, que passou a estabelecer que os prazos processuais voltariam a fluir normalmente a partir de 4 de
maio de 2020. O Conselho Nacional de Justiça, editou a Resolução n. 314, de 20 de abril de 2020, em que prorrogava o regime instituído pela Resolução n. 313/20, e modificava as regras de suspensão de
prazos processuais. Da mesma forma, a Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho, com o Ato n. 11/GCGJT, de 23 de abril de 2020, regulando vários assuntos, como a não ocorrência de audiência
presencial. No dia 27 de abril de 2020, o TRT14 editou o Ato TRT14/GP n. 6/2020, instituindo que durante o período de isolamento social, objetivando reduzir a possibilidade de contágio da Covid-19, as
diretrizes para realização de audiências telepresenciais nas varas dos trabalho e nos centros judiciários de métodos consensuais de solução de disputas (CEJUSCs)
de 1º e 2º graus.
Com a realização das audiências por videoconferência, inúmeras incertezas passaram a ser cogitadas, pois em que pese, desde a Lei n. 11.419/06, o Poder Judiciário vem se socorrendo dos meios
tecnológicos para a prática de ato processual, mas não se tinha chegado com tanta intensidade, face a pandemia que todos estão vivendo. Há quem concorde que a prática de tais audiências trará
inúmeros benefícios, há quem observe com reserva.
Princípios aplicáveis tanto na CLT como no CPC/2015
Tanto a CLT como o CPC consagram princípios em comum e que devem ser observados quando da realização de uma audiência, como princípio da Oralidade (art. 820 CLT); princípio da Conciliação (arts.
764, 831, 846 e 850 da CLT); princípio da Imediatidade ou Imediação (art. 820 DA CLT / art. 139 E 481 CPC); princípio do Jus Postulandi (arts. 791 e 839, “a”, da CLT); princípio da Concentração dos Atos
Processuais (arts. 849 e 852-C, da CLT); princípio da Instrumentalidade (art. 188 do CPC e art. 794 da CLT); princípio da Publicidade e Acesso à Justiça (art. 11 do CPC); princípio da Isonomia (art. 5º CF/88);
princípio da Cooperação (artigo 6º do CPC). Princípio da oralidade – Numa audiência gravada, os atos orais alcançam uma força maior, já que não ocorre como numa audiência presencial, num processo
físico, em que há a redução a termo.
Princípio da imediatidade – contato mais próximo do Juiz com as partes, testemunhas e qualquer outro meio de prova, visando a verdade real. Não há dúvidas, que os magistrados terão que reaprender
técnicas nessa busca da verdade real numa audiência por videoconferência.
Princípio da publicidade e acesso à Justiça – Os meios tecnológicos surgiram como excelentes ferramentas de publicidade, contudo, o mesmo não ocorre com o acesso à justiça, pois inúmeras pessoas não
possuem conhecimentos ou mesmo acesso à internet. Princípio da isonomia – Princípio a ser observado principalmente quando se busca uma padronização dos sistemas tecnológicos por todos os tribunais
com vistas a uma segurança jurídica a todos os jurisdicionados. Princípio da cooperação – estimula a cooperação de todos, para que em tempo razoável, obtenha-se decisão de mérito. Ganha ainda mais
força tal princípio, no momento de isolamento social que a sociedade vem vivendo, sem data para terminar.
Virtualização das audiências em tempos de pandemia
Situação que muitos profissionais da área tem observado durante esta pandemia, com os trabalhos em home office, uma certa celeridade na movimentação dos processos. Não há dúvidas, que a utilização
dos meios tecnológicos, e ainda mais audiência por videoconferência, tornam os atos processuais mais objetivos; leva a uma economia processual, uma enorme redução de custos. Possibilitando às partes
e advogados estarem em audiências no mesmo dia, em comarcas diferentes.
No entanto, a virtualização das audiências traz preocupação tanto às partes como para a advocacia. O “Jus Postulandi” da parte, por exemplo, que em sua maioria, é pessoa leiga, não somente no aspecto
jurídico, mas principalmente no tecnológico, e que enfrentará muita dificuldade para acompanhar as audiências de conciliação e instrução.
Não bastasse isso, verifica-se a dificuldade também enfrentada por advogados, já que exige do profissional conhecimento de informática, em que muitos não estão acostumados. Ainda mais que as
audiências estão sendo implementadas, sem qualquer tipo de preparação, treinamento ou orientação.
Princípio da incomunicabilidade de testemunha
Num cenário de pandemia, as audiências de instrução levarão advogados a manterem contatos com partes e testemunhas, correndo o risco de contaminação. Não bastasse isso, o Poder Judiciário
preocupado com a quantidade de audiências represadas, face a pandemia que o país vem sofrendo, encontrou como alternativa, que as audiências ocorram de forma virtual.
O grande desafio para a virtualização é a ocorrência de audiência de instrução por videoconferência. Principalmente, quanto a não observação do princípio da Incomunicabilidade de Testemunha”, ou seja, a
aplicação do art. 456 do CPC4, em sua integralidade. O Poder Judiciário entende que assim como numa audiência presencial, numa audiência por videoconferência, o magistrado terá capacidade para
verificar qualquer tipo de irregularidade e tomar as providencias necessárias, bem como, formar seu convencimento mesmo com depoimentos maculados. Alegam que situações de violação ao princípio da
Incomunicabilidade de testemunhas, não seja motivo para a não ocorrência das audiências.
Contudo, tal entendimento não é pacífico e unânime. Sendo que alguns tribunais olham com uma certa cautela e possibilitando às partes aguardar o retorno das atividades presenciais5. O Código de
Processo Civil prevê que atos da audiência de instrução sejam realizados por videoconferência (arts. 385, § 3º6 e 453, § 1º7 do CPC). Contudo, o princípio da incomunicabilidade de testemunha melhor se
aplica numa audiência presencial, em que uma testemunha ou parte é ouvida, as demais permanecem do lado de fora da sala de audiência. Num processo virtual, há quem entenda que isso ocorra também,
através do chamado “lobby”. Uma espécie de sala de espera que o aplicativo Cisco Webex proporciona. (…)
Oportuno esclarecer, as testemunhas não presenciarão o depoimento das partes e das outras testemunhas, pois o magistrado as deixará no lobby, uma espécie de sala de espera virtual na qual
permanecerão incomunicáveis. Quando for o momento de colher o depoimento da testemunha, a mesma regressará à sala de audiência virtual8.
Contudo, verifica-se que tal aplicativo não está sendo usado por todos os tribunais e muito menos se vislumbra tal lobby nos demais aplicativos. O que simplesmente se verifica é a utilização das
plataformas virtuais para cumprimento dos atos processuais, em que as audiências não são gravadas e simplesmente reduzido a termo o que ocorre numa audiência virtual. O entendimento que o judiciário
espera dos envolvidos numa audiência de instrução é a aplicação do princípio da boa-fé. O princípio da boa-fé processual, portanto, que também constitui um desdobramento do princípio da boa-fé objetiva
do Código Civil, tem por escopo impor aos litigantes uma conduta ética e de respeito mútuo, que possa ensejar o curso natural do processo e levá-lo à consecução de seus objetivos: a prestação
jurisdicional de modo célere, adequado, tempestivo e justo (Leite, 2019).
Dos atos normativos e a audiência de instrução por videoconferência
O Conselho Nacional de Justiça determinou através da Resolução n. 314, de 20 de abril de 2020, que os Tribunais Regionais do Trabalho deveriam disciplinar com os demais órgãos do sistema de justiça, a
realização de todos os atos processuais.
O Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região, por meio do Ato n. 003/2020/TRT14/GP, de 18 de março de 2020, em seu art. 2º, § 5º, de que em havendo consenso entre as partes, ausência de prejuízo e
viabilidade tecnológica, fica facultada, a critério do juiz, a realização de audiências por videoconferência. Percebe-se acima, que a decisão sobre a realização ou não da audiência de instrução por
videoconferência, a bem da verdade, não será um consenso entre as partes e, sim, a critério do magistrado.
Compreende-se que apesar da suspensão dos processos, das medidas de combate à Covid-19, as ações trabalhistas estão sendo propostas, ocorrendo o acúmulo de atos processuais a serem praticados
pelas secretarias e magistrados, o que leva a eliminar o represamento de demandas já ocorrido desde o início da pandemia.
Contudo, visando dar prosseguimento a marcha processual, a Justiça do Trabalho tem marcado as audiências por videoconferência, mas continua praticamente em trabalho remoto, sem qualquer tipo de
atendimento externo, implementando as medidas de combate ao novo coronavírus.
Ao passo que os escritórios de advocacia estão tendo que receber partes e testemunhas, pois muitos não entendem da tecnologia exigida para participarem de uma audiência virtual e nem mesmo celular.
Importante registrar que a Justiça do Trabalho lida com jurisdicionado de pouca instrução e condição econômica.
Fica nítido que o princípio da cooperação, previsto no art. 6º do CPC9, não está sendo observado, pois a exigência de que as partes cooperem para que o processo alcance bom resultado, em tempo
razoável, vai além disso. Pela redação do art. 6º do novo CPC todos os sujeitos processuais devem colaborar entre si, o que, ao menos em tese, envolveria a colaboração das partes com o juiz, do juiz com
as partes e das partes entre si10.
Incumbe, ainda, ao Judiciário manter à disposição dos interessados, em suas unidades, e para utilização gratuita, os equipamentos necessários à prática de atos processuais por meios eletrônicos e à
consulta e acesso ao sistema de automação e aos documentos nele constantes (art. 198). Não havendo esses equipamentos, será permitida a prática de atos por meio não eletrônico, ainda que sejam
eletrônicos os autos do processo11.
O entendimento que o judiciário espera dos envolvidos numa audiência de instrução é a aplicação do princípio da boa-fé. Obvio que a objetivo precípuo do juiz, diz respeito a marcha processual, o que não
é diferente com partes e advogados. Entretanto, os advogados trabalhistas tem a preocupação com a enorme probabilidade de contágio à Covid-19 ao trazerem parte e testemunhas aos seus escritórios.
O Conselho Nacional de Justiça publicou a Resolução n. 322 em 1/6/2020, estabelecendo, no âmbito do Poder Judiciário, medidas para retomada dos serviços presenciais, a partir de 15 de junho de 202012.
Ficando a critério dos tribunais sobre o momento oportuno da retomada, observadas as ações necessárias para prevenção de contágio pelo novo coronavírus – Covid-19.
O próprio inciso IV do art. 5º da referida resolução13, aponta sobre a possibilidade mista quando da realização de audiência virtual, com a presença de algumas pessoas nos prédios da Justiça do Trabalho.
O que viabilizaria uma segurança maior para as audiências de instrução e retiraria tal incumbência dos escritórios de advocacia. Sendo possível a oitiva de testemunhas na própria Justiça do Trabalho
(presencial ou não), enquanto partes, juiz e advogados participando ao mesmo tempo por videoconferência, assegurando assim, a incomunicabilidade de testemunhas prevista no art. 456 do CPC, bem
como, assegurando-se todas as medidas necessárias para se evitar o contágio da Covid-19 aos sujeitos do processo.
4 Considerações finais
Desde o momento que foi decretada a pandemia da Covid-19 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 11 de março de 2020, a sociedade passou a enfrentar inúmeras dificuldades econômicas e de
saúde pública, submetendo- se a inúmeras situações de restrições, como quarentena, isolamento social, distanciamento, lockdown, entre outras.
Tal situação levou o Poder Judiciário a adotar o regime de plantão extraordinário, suspendendo prazos e audiências, com o objetivo de prevenir o contágio pelo novo coronavírus. Meses depois, visando a
retomada da marcha processual, o Poder Judiciário resolve implementar as audiências por videoconferência, inicialmente as de conciliação, posteriormente as de instrução. Um cenário novo, em que se
trouxe múltiplas questões acerca da prática de atos processuais por meio virtual, em especial, os atos de instrução por meio das plataformas digitais.
Contudo, ainda com a curva de contaminação do novo coronavírus na ascendência, audiências de instrução de forma virtual passaram a ser exigidas, em que pese as normativas estabelecessem que
qualquer impossibilidade, seja tecnológica, seja de pessoas do grupo de risco, ficava ao final, a critério do juiz decidir sobre sua realização ou não. Fazendo com que advogados levassem partes e
testemunhas aos seus escritórios, com o enorme perigo de contágio ao novo coronavírus, enquanto, o Poder Judiciário mantém-se em plantão extraordinário. Sendo inaceitável atribuir aos procuradores, a
incumbência de orientações tecnológicas aos seus clientes, bem como, o comparecimento de partes e testemunhas a qualquer localidade fora das estruturas físicas do Poder Judiciário para participarem de
audiências por videoconferência.
Este cenário deixou evidente que a chamada distribuição de justiça pelo meio virtual, eclodiu a desigualdade tecnológica entre os envolvidos num processo, bem como, a necessidade de melhor aplicação e
interpretação dos atos processuais previstos na CLT e no CPC numa audiência de instrução por videoconferência, como respeitar em sua integralidade, o princípio da incomunicabilidade de testemunhas
(art. 456 do CPC), além de uma melhor observância aos princípios da cooperação, imediatidade e do acesso à justiça.
Referências
BRASIL. LEI N. 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm Acesso em: 22 maio 2020.
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2019.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 2019.
MANUAL PARA PARTES E TESTEMUNHAS SOBRE O USO DA VIDEOCONFERÊNCIA. Disponível em: www.cnj.jus.br/plataforma-videoconferencia-nacional/manual-para-partes-e-testemunhas-sobre-o-uso-da-
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NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 9. ed. São Paulo, Editora Podium, 2017.
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Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/diarios/298436476/trt-5-judiciario-22-05-2020-pg-2784?ref=serp Acesso em: 22 maio 2020.
VIEIRA, Fernando Borges. Orientações para atuação eficaz do advogado em audiência trabalhista virtual. Disponível em: www.conjur.com.br/2020-mai-20/orientacoes-atuacao-eficaz-advogado-audiencia-
virtual Acesso em: 24 maio 2020.
Notas
1 Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Coronav%C3%ADrus
2 Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima
de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.
§ 7º A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da lei.
3 Disponível em: https://www.cnj.jus.br/plataforma-videoconferencia-nacional/manualpara-partesetestemunhas-sobreo uso-da-videoconferencia/
4 Art. 456. O juiz inquirirá as testemunhas separada e sucessivamente, primeiro as do autor e depois as do réu, e providenciará
para que uma não ouça o depoimento das outras. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm
5 Processo: 0000183-32.2020.5.05.0122 PROCESSO: 0000183-32.2020.5.05.0122
Fica V. Sa. notificada para: Tomar ciência do teor do Despacho de ID 05ecc78: “Considerando o disposto no Ato Conjunto CSJT.GP. VP e CGJT. N. 001, de 19 de março de 2020, suspendendo a prestação
presencial de serviços no âmbito da Justiça do Trabalho de 1º e 2º graus, a audiência retro designada restou cancelada. Em vista disso, considerando o novo provimento proferido pela Corregedoria Geral
do TRT5 no Ato CR TRT5 N. 21, de 27 de abril de 2020, bem como pelo CNJ nas Resoluções n. 313 e 314 de 2020, passa este juízo a adotar as seguintes providências: 1- Assino à Reclamada o prazo de 15
(quinze) dias para apresentação de defesa escrita, sob as penas do artigo 844 da CLT, acompanhada dos documentos necessários à instrução, declarando as demais provas que pretenda produzir,
justificando a necessidade, sob pena de preclusão, quanto a estas. Na oportunidade, deverá se manifestar ainda sobre o interesse em realizar a audiência por meio de videoconferência, ou aguardar o
retorno das atividades presenciais para a designação da assentada…”.
CANDEIAS/BA, 22 de maio de 2020. JUSSARA MARIA SERRA DE MACÊDO. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/diarios/298436476/trt-5-judiciario-22-05-2020-pg-2784?ref=serp 22.05.2020
6 § 3º O depoimento pessoal da parte que residir em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo poderá ser colhido por meio de videoconferência ou outro recurso
tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.
7 § 1º A oitiva de testemunha que residir em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico
de transmissão e recepção de sons e imagens em tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a audiência de instrução e julgamento.
8 Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-mai-20/orientacoes-atuacao-eficaz-advogado-audiencia-virtual Acesso em: 24 maio 2020.
9 Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
10 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 9. ed. São Paulo, Editora Podium, 2017.
11 CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 199.
12 Art. 3º Ficam autorizados os tribunais, a partir de 15 de junho de 2020, na normatização a ser editada, a implementarem as seguintes medidas: No prazo de dez (10) dias, a contar da data em que
decidirem pela retomada das atividades presenciais, os tribunais deverão editar atos normativos no âmbito de suas jurisdições, com o objetivo de estabelecer regras de biossegurança, em consonância com
esta Resolução e com as Resoluções CNJ n. 313/2020, n. 314/2020 e n. 318/2020, no que aplicável, promovendo adaptações, quando justificadas, tomando por base o estágio de disseminação da Covid-19
na área de sua competência.
13 Art. 5º Para a retomada dos trabalhos presenciais durante a primeira etapa, serão observadas as seguintes medidas:
(…) IV – As audiências serão realizadas, sempre que possível, por videoconferência, preferencialmente pelo sistema Webex/CISCO disponibilizado por este Conselho, possibilitando-se que o ato seja
efetivado de forma mista, com a presença de algumas pessoas no local e participação virtual de outras que tenham condições para tanto, observando- se o disposto no artigo 18 da Resolução CNJ n.
185/2017 (…)
Jefferson Freitas Vaz
Graduado em direito pela Universidade Luterana do Brasil (Ceulji/Ulbra). Professor orientador, Especialista em Direito Processual Civil, Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. E-mail: [email protected]