O novo perfil da Advocacia pós-pandemia

1 Introdução

A presente análise visa a abordagem dos efeitos da pandemia da Covid-19 no exercício da Advocacia, com foco nas necessárias transformações pelas quais o exercício da Advocacia passará, apresentando um novo perfil, pós-pandemia, em vários aspectos de sua atuação.

Sendo o advogado essencial à administração da justiça, abordar-se-á a história da Advocacia brasileira, que perpassa pela criação das normativas legais próprias, desde o Decreto n. 19.408, de 18 de novembro de 1930, criado durante o governo do Presidente Getúlio Vargas até o Estatuto da OAB vigente, Lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994, bem como o Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, instituído pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil constando em seu preâmbulo que “norteou-se por princípios que formam a consciência profissional do advogado e representam imperativos de sua conduta” na Resolução 2/2015, que aprovou o Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Abordar-se-á o novo perfil da Advocacia pós-pandemia com a adoção de novas e boas práticas e condutas, bem como ferramentas tecnológicas que permitam a conexão com o novo mundo que se descortina, e a necessária adaptação da consciência sobre a pandemia e seus reflexos, o que auxilia, em muito, o poder de transformação e adaptação no exercício da Advocacia.

2 A Advocacia Brasileira

A Ordem dos Advogados do Brasil foi criada pelo Decreto n. 19.498, de 18 de novembro de 19301, durante o governo do Presidente Getúlio Vargas. A partir daí, foram elaborados vários regulamentos2 que disciplinaram acerca do exercício da Advocacia, sendo que “A Lei n. 4.215 disciplinou o exercício da profissão advocatícia durante 31 anos. Dentre do espírito daquele Estatuto, a Ordem esteve voltada fundamentalmente para os aspectos formais da disciplina e fiscalização, seleção e prerrogativas profissionais.”3

Em 1994, foi elaborada a Lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994, que disciplina sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) a qual encontra-se vigente, prevendo em seu artigo 44, a Ordem dos Advogados do Brasil como prestadora de serviço público, “dotada de personalidade jurídica e forma federativa”, tendo por finalidade:

I – defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;

II – promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.” No exercício da Advocacia, o advogado exerce função social, correspondendo “a uma exigência da sociedade. (…) sem liberdade, não há advogado, sem a intervenção não há ordenamento jurídico e sem este não há condições de vida para a pessoa humana. Logo, a atuação do advogado é condição imprescindível para que funcione a justiça. Não resta, pois, a menor dúvida de que o advogado exerce função social.”4 Tem-se que o advogado, no exercício de seu mister, de forma independente dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, possui a missão de contribuir com o Estado Democrático de Direito, fortalecendo-o, sendo a Advocacia não tão-somente uma profissão, mas entendida e reconhecida como “um munus, é a única habilitação profissional que constitui pressuposto essencial à formação de um dos Poderes do Estado: o Poder Judiciário”.5 No exercício da Advocacia, ocorre a consolidação dos interesses sociais, com busca à garantia do acesso à justiça, destacando-se aí a mais lídima função social, considerada como “a sua mais importante e dignificante característica”.6

Desse modo, no exercício da Advocacia, busca-se atender às necessidades sociais que se apresentam, buscando sua consolidação de forma justa e equânime, representando uma função essencial à justiça e ao exercício da jurisdição7.

Justamente por estar fundamentalmente ligada aos clamores sociais, é que se faz necessário que no exercício da Advocacia, os profissionais advogados acompanhem as mudanças sociais e possam adaptar-se a elas.

3 O novo perfil da Advocacia pós-pandemia

Com a decretação da pandemia gerada pela Covid-19, vivenciamos, a nível mundial, mudanças radicais nos comportamentos sociais, que, consequentemente, refletem nas relações jurídicas, havendo uma necessidade gritante de adaptação à nova realidade. E isso é algo que está ocorrendo em todos os setores do mercado de trabalho, mormente na Advocacia brasileira. O exercício da Advocacia, como outras profissões, exige muita dedicação, horas de estudos, pesquisa, atualizações, estratégia de marketing, dentre outros.

Do profissional advogado espera-se domínio de conhecimento, conduta ética, comprometimento com seu cliente, atentando ao cumprimento das normativas específicas no exercício de seu mister, bem como às normas do ordenamento jurídico.

Nos tempos atuais, vivenciando a Covid-19 e seus efeitos, é fato que muitas mudanças e adequações, inclusive no exercício da Advocacia, se fazem necessárias. O modo como o profissional advogado se relaciona com sua clientela, a sua atuação no processamento de uma ação judicial, sua relação com o mundo virtual, digitalizado; é algo latente, e que, fatalmente, conduz à necessidade de ressignificar conceitos, principalmente de espaço e tempo. No exercício da Advocacia, o advogado exerce função social, correspondendo “a uma exigência da sociedade. (…) sem liberdade, não há advogado, sem a intervenção não há ordenamento jurídico e sem este não há condições de vida para a pessoa humana. Uma atuação profissional que exigirá, cada vez mais, o uso de novas estratégias de relacionamento com o cliente, cabendo ao profissional advogado acompanhar as mudanças que são frutos da pandemia. A pandemia que está sendo vivenciada demonstra, com o passar dos dias, que é tempo de mudanças, de transformação, havendo uma premente necessidade de adequação nas atitudes e adaptação do exercício profissional. Novas tecnologias e ferramentas auxiliam no aumento da produtividade, reduzindo custos e aprimorando os serviços jurídicos oferecidos.
O novo mundo que se descortina reclama novos modelos de gestão e de negócios, e também um novo modo de comunicação, com velocidade, por meio de plataformas e ferramentas, estabelecendo novas conexões.

O exercício da Advocacia pós-pandemia exigirá, ainda, dos profissionais, o desenvolvimento de habilidades e competências, com destaque à multidisciplinaridade, havendo necessidade da atuação de profissionais das mais variadas áreas do conhecimento, visando o aprimoramento na prestação dos serviços jurídicos. Desse modo, descortina-se uma necessidade quanto à conscientização de que se apresenta um novo modelo de mercado e que o poder da informação para alcançar e concretizar transformações, compreende também a adoção de novas técnicas e metodologias para o manuseio novas ferramentas. Vários paradigmas foram quebrados com a pandemia da Covid-19 e, consequentemente, se faz necessárias adequações ao novo mundo que se descortina à nossa frente.

Nos encontramos em plena era da automação dos processos, vivenciando processos eletrônicos. A era da realização de teleaudiências, reuniões de trabalho via ferramentas como Meet, Zoom; a versão do home office, dentre outras, havendo uma necessária urgência de adaptação aos novos modelos de atuação. Trata-se da inserção num novo contexto, que exigirá dos profissionais advogados, no exercício da Advocacia, a soma de vários esforços em busca das transformações e adequações que se fazem necessárias ao novo perfil da Advocacia pós-pandemia.

A tomada de decisões e escolhas, na forma de atuar, do modo mais assertivo, se desponta como necessária frente aos impactos da pandemia, envolvendo não só ferramentas tecnológicas, mas também as comportamentais, sendo consideráveis os desafios que se descortinam no exercício da Advocacia, pós-pandemia, que certamente contará com um novo perfil. Revisitar valores e conceitos, diante da percepção da nova realidade, contribuirá para a concretização de superação dos novos desafios, com a adoção e construção de novas posturas, sem descuidar, obviamente, da obediência às normas específicas que regem o exercício da Advocacia.

A pandemia que está sendo vivenciada demonstra, com o passar dos dias, que é tempo de mudanças, de transformação, havendo uma premente necessidade de adequação nas atitudes e adaptação do exercício profissional. Imperioso ressaltar que o novo perfil da Advocacia exigirá não só a organização de natureza estrutural, mas também socioemocional em relação ao cliente/jurisdicionado, o qual também deve ser envolvido nesse processo de transformação e adequação, bem como os colaboradores que se fazem presentes no escritório de Advocacia, no cotidiano.

Desse modo, registra-se a necessidade dos vários cuidados com a pessoa do cliente, dispensando-lhe trato humanizado, o encantamento, visto que tanto a tecnologia quanto as ferramentas virtuais, servirão de suporte ao exercício da Advocacia, que possui uma relação muito direta com a existência humana, visto possuir uma função social. O novo cenário que se apresenta perpassa por momentos de reflexão, buscando restabelecer as relações pessoais, profissionais, jurídicas, sem descuidar do ser humano e de suas necessidades.

Assim, tem-se que a vivência que está sendo experienciada em todos os setores, exigirá do profissional Advogado novas ações para o enfrentamento desse processo, durante e pós-pandemia, levando-o à superação, com uso de mecanismos de aproximação. As atitudes positivas são de suma importância para compreender a realidade atual e planejar a transformação utilizando-se das ferramentas tecnológicas.

4 Considerações finais

Ao se abordar os efeitos pós-pandemia no exercício da Advocacia e o seu novo perfil, tem-se um ciclo que se encerra para dar lugar a um novo ciclo que se inicia, pautado no poder transformador que uma crise pode gerar. É necessário, ainda, um planejamento para os novos desafios que despontam para o novo perfil da Advocacia pós-pandemia, com vistas às superações, mudança de hábitos e conceitos, exercitando a resiliência, instalando e conservando a credibilidade na sociedade, considerando a responsabilidade social no exercício da Advocacia.

Nos tempos atuais e vindouros, pós-pandemia, a tecnologia se apresenta como uma aliada ao profissional Advogado, visto que a vida se modifica, exigindo um despertar da consciência acerca da pandemia e de seus reflexos, o que auxiliará, em muito, o poder de transformação e adaptação no exercício da Advocacia.

Assim, atitudes positivas são de suma importância para auxiliar na compreensão da realidade vivenciada atualmente e no planejamento da transformação, com a utilização das ferramentas tecnológicas.

Cuidar e cumprir os protocolos de biossegurança também é algo que já é vivenciado no exercício diário da Advocacia e continuará presente no novo perfil da Advocacia pós-pandemia, tendo em vista a necessidade dos cuidados básicos na convivência diária entre as pessoas, como exteriorização de respeito ao ser humano.

Notas


1 Art. 17. Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, órgão de disciplina e seleção da classe dos advogados, que se regerá pelos estatutos que forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo.
2 Decreto n. 20.784, de 14.12.1931, Decreto n. 22.478, de 20.2.1933, Lei n. 4.215, de 27/4/1963.
3 COSTA, Elcias Ferreira da. Deontologia jurídica. Ética das profissões jurídicas. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008.
4 SODRÉ, Ruy de Azevedo. A ética profissional e o estatuto do advogado. 4. ed. São Paulo: LTr, 1991.
5 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
6 LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
7 BITTAR, Eduardo C. B. Curso de Ética Jurídica – Ética geral e profissional. 6. ed. São Paulo: Saraiva.

Referência


BITTAR, Eduardo C. B. Curso de Ética Jurídica – Ética geral e profissional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
COSTA, Elcias Ferreira da. Deontologia jurídica. Ética das profissões jurídicas. Rio de Janeiro: Editora Forense,
2002.
BRASIL. Decreto n. 19.408, de 18 de novembro de 1930. Reorganiza a Corte de Apelação e da outras providências.
Disponível em: www.oabsp.org.br/portaldamemoria/destaque/decreto%20criacao%20da%20oab.pdf.
BRASIL. Decreto n. 20.784, de 14 de dezembro de 1931. Aprova o Regulamento da Ordem dos Advogados
Brasileiros.
BRASIL. Decreto n. 22.478, de 20 de fevereiro de 1933. Aprova e manda observar a consolidação dos dispositivos
regulamentares da Ordem dos Advogados do Brasil.
BRASIL. Lei n. 4.215, de 27 de abril de 1963. Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.
LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 21.. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
SODRÉ, Ruy de Azevedo. A ética profissional e o estatuto do advogado. 4. ed. São Paulo: LTr, 1991.

Rosicler Carminato Guedes de Paiva

Professora e coordenadora do curso de direito do Centro Universitário São Lucas Ji-Paraná. Membro efetivo da Comissão do Ensino Jurídico da Ordem dos Advogados do Brasil, OAB-RO, subsecção de Ji-Paraná. Training Practitioner em Programação Neurolinguística (PNL).